quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Isso também passa


Sempre tive uma mania irritante de acreditar que nada passa. Desde criança, minha mãe tentava me convencer, com diversos argumentos e exemplos, de que tudo, não importa o quão bom ou ruím seja, vai passar.
Lembro quando eu tinha 4 anos e queimei meu braço com água fervente e perdi parte da pele dele. Minha mãe me conta que foi um período sofrido, em que eu tinha que ir ao hospital todos os dias trocar os curativos. Eu chorava, reclamava de dor e dizia que meu braço nunca ia melhorar. Ela, pacientemente, me dizia que ia passar e, por mais que fosse lentamente, já estava melhorando. Tentava me fazer enxergar o progresso, as cicatrizes que apareciam e os indícios de uma nova pele. Porém, eu achava mais cômodo me ater às partes que estavam machucadas e à dor que ainda vinha, vez ou outra. Até que um dia, o médico disse que eu não precisava mais ir ao hospital, pois a pele já tinha regenerado e eu poderia prosseguir os cuidados em casa mesmo. Nesse dia, minha mãe sorrindo, contente em me ver livre do sofrimento, me disse: "Eu não falei que ia melhorar? Agora já passou!". Eu sabia que ela estava certa, mas preferi comentar das feias cicatrizes que tinham ficado.
Claro, que, naquela época, eu agia daquela forma inconscientemente. Não entendia toda essa história de otimismo, pensamento positivo e efemeridade.
Muita coisa aconteceu depois disso. Muitos machucados cicatrizaram sem que eu percebesse. Muitos sentimentos passaram sem que eu me desse conta. Muitas pessoas se foram sem que eu pudesse me despedir. Hoje, mais de 15 anos depois, creio que eu não seja muito diferente daquela menininha de 4 anos com o braço queimado. Depois de tantas experiências pra provar o que minha mãe sempre tentou me mostrar, eu, no fundo, sei que tudo passa. Mas saber não é o bastante. E eu continuo vendo as feridas no coração como o queimado no meu braço: doloridas e demoradas.
Ontem à noite, me peguei pensando em quanto gostaria que o tempo passasse mais rápido e fizesse acabar com o que machuca. Fechei os olhos, desejando que as horas não mais arrastassem e, quando abri, já era dia.
A verdade é que isso também passou, mas eu prefiro não enxergar.